Com a aproximação do inverno e as quedas nas temperaturas em diferentes regiões agrícolas do país, um fenômeno volta a causar tensão às plantações de café: as temíveis geadas.
Assim como as chuvas são características no verão, as geadas são fenômenos climáticos recorrentes no inverno. Elas ocorrem quando a temperatura e a umidade relativa do ar caem repentinamente.
Por isso, conhecer as causas e danos causados pelas geadas e, principalmente, as estratégias de proteção das plantações de café é fundamental para que cafeicultores enfrentem esse fenômeno com as ferramentas certas.
Danos causados pelas geadas nas plantações de café
Antes de conhecer os danos que podem ser causados pelas geadas nas plantações de café, é imprescindível entender as causas desse fenômeno para, assim, aumentar as chances de sucesso no combate.
Segundo o Professor José Donizeti Alves, sócio da FisioCafé Consultoria e Palestras Ltda., os danos provocados pelas geadas ocorrem por dois motivos:
- Expansão da seiva congelada no interior da planta — que literalmente estoura as células; e
- Perfuração das células pelos cristais de gelo que se formaram durante o congelamento da seiva.
“Tanto a expansão do suco celular como a formação desses cristais de gelo ocorrem quando a temperatura atinge zero graus Celsius. Quando isso acontece, ocorre a queima de folhas, ramos e, em geadas de maior intensidade, o caule”, complementa o professor.
Mas, independentemente disso, Williams Pinto Marques Ferreira e Marcelo de Freitas Ribeiro, pesquisadores da Epamig Sudeste, explicam que, de forma crítica, a produtividade das lavouras é sempre afetada, já que os botões florais, flores e frutos podem ser impactados.
“É comum, também, serem verificadas novas brotações nas partes mais externas da planta quando ocorre a geada de capote, ou na parte do ramo ortotrópico [eixo vertical da planta], quando ocorre a geada de canela”, dizem.
Mas os pesquisadores da Epamig ressaltam que o principal dano causado pelo fenômeno é quando ocorre a “geada negra”. Nesses casos, as lavouras são prejudicadas por conta do congelamento da seiva presente no caule da planta.
“Nela, não há o congelamento visível nas partes externas da planta, mas, devido à baixa temperatura, ocorre um desequilíbrio químico, que reduz o potencial da água presente na solução intercelular e aumenta o potencial do soluto na planta”, explicam os pesquisadores. Com isso, ocorre o congelamento da solução, rompendo a membrana celular e provocando a morte do tecido vegetal.
Regiões produtoras brasileiras que merecem atenção quanto às geadas
Normalmente, o maior risco do surgimento das geadas está associado às regiões serranas. “Nestas, as áreas de vales são as mais suscetíveis, pois o ar frio escorre pelas encostas e se estabelece nos vales entre as serras”, explicam Ferreira e Ribeiro.
Paraná, Alta Mogiana no estado de São Paulo, sul de Minas Gerais e o cerrado mineiro são também as regiões do país que correm maior risco de geadas. “No cerrado mineiro, o vento frio nas partes mais acidentadas ao longo do planalto contribui para a ocorrência de geadas nas plantações de café”, explicam os pesquisadores.
Já dentro de uma fazenda, as áreas de baixadas são as mais suscetíveis à formação de geada. “Recomenda-se que o produtor não plante café nessas áreas, mas, de maneira geral, ele planta sabendo que um dia a geada vai acontecer e poderá dizimar as plantações de café”, complementa Alves.
Estratégias para enfrentamento das geadas em plantações de café
Várias são as estratégias e métodos que podem ser adotados por cafeicultores para enfrentar as geadas e suas consequências. Segundo os pesquisadores da Epamig, existem métodos passivos e ativos.
Os métodos passivos são aqueles feitos antes da ocorrência da geada, como:
- Escolha do local do plantio;
- Plantio de árvores com grandes copas em meio à lavoura;
- Manejo correto para a drenagem do ar frio;
- Manejo nutricional das plantas;
- Cobertura com terra de plantas jovens, até seis meses, que estão no campo.
“Plantas com um ano e meio podem ser protegidas colocando-se terra sobre o seu caule o mais alto possível. No caso de plantas adultas, recomendamos a limpeza das ruas sem as plantas espontâneas para facilitar o escoamento do ar frio”, ressaltam Ferreira e Ribeiro.
Os métodos de proteção ativa para mitigar os efeitos das temperaturas abaixo de zero devem ser feitos durante a noite de geada. Entre eles, pode-se destacar a irrigação e o uso de aquecedores e termonebulizadores.
Dentro dessas estratégias ativas de proteção das plantações de café, o professor José Donizeti Alves explica que é preciso evitar que os líquidos se congelem no interior das plantas, principalmente as folhas. “Precisamos abaixar o ponto de congelamento da água dentro dos tecidos vegetais, utilizando-se de meios que concentrem a seiva da planta”, observa.
Neste caso, três estratégias são eficientes:
1. Suspender a irrigação dias antes da geada
2. Pulverização com sais, principalmente os de potássio
Ao abaixar o potencial hídrico e osmótico das células, impondo um déficit hídrico moderado no cafeeiro, o professor explica que o cafeicultor consegue manter os tecidos parcialmente desidratados, concentrando os solutos na solução.
Desse modo, menores temperaturas serão necessárias para solidificar a água e formar os perigosos cristais de gelo. “O segredo é não diluir a seiva, afastando ligeiramente o solo da capacidade de campo para diminui a água disponível para as plantas”, explica Alves.
3. Irrigar a lavoura por aspersão, horas antes de a temperatura cair a zero
Nesse caso, a água depositada na superfície do vegetal será congelada e, ao se manter a 0°C, é formada uma película protetora das plantas, evitando o congelamento dos líquidos internos. “A energia que seria gasta para congelar a folha é gasta para congelar a água que está sobre ela, garantindo sua proteção”, diz o professor. “É como se fosse o iglu, que é todo feito de gelo, mas preserva o ambiente interno aquecido”, complementa.
Como manejar as lavouras de café após a geada?
Vimos, em nosso tópico anterior, as estratégias e métodos passivos e ativos para preparar as plantações de café para a chegada das geadas. Mas o que fazer depois da passagem desse fenômeno?
Essa decisão deve ser tomada em função da magnitude da morte dos tecidos nos cafeeiros. Quanto maior a quantidade de tecidos mortos, mais drástica será a intervenção, que pode chegar até mesmo à substituição das lavouras.
Segundo Alves, as intervenções pós-geada devem ser feitas depois de 30 dias, a fim de se verificar, com maior segurança, a intensidade dos danos.
Ele explica que, quando a queima for somente nas folhas mais externas das plantas, o cafeicultor deve simplesmente esperar que a própria planta reaja e se regenere.
Mas, quando a queima atingir também as folhas mais internas e os ramos, opta-se pela poda do tipo “desponte” ou o “esqueletamento”. Quando a queima atingir o caule, a opção é a poda do tipo “recepa”, ou arrancar as plantas mortas e fazer um novo plantio.
O cafeeiro podado levará de 2 a 3 anos para começar a produzir. Diante da necessidade de podas, a regra é: quanto menos cortar, melhor. Com relação à renovação da lavoura, deve-se considerar a mortalidade das plantas, que gerarão o estande produtivo quando a lavoura se recuperar.
Por fim, a recomendação final dos pesquisadores e do professor é sempre contratar um consultor ou um profissional especializado que tenha prática com esse tipo de fenômeno.