Em poucos dias, o mundo inteiro vai olhar para o Brasil. A COP30, a maior conferência do clima, será realizada em plena Amazônia. E, inevitavelmente, o agronegócio brasileiro estará no centro do palco.

E aqui eu escolho ser clara: não vejo a COP30 como uma grande oportunidade romântica. Vejo como um desafio enorme. Porque sei, de dentro do campo, que o agro brasileiro tem muito a mostrar em termos de sustentabilidade, inovação e preservação. Mas também sei que, muitas vezes, preferem reforçar apenas a narrativa da destruição.

No ano passado estive no Pará, na região da Transamazônica, para palestrar. Ao sobrevoar a área, o que mais vi foi verde. Uma imensidão de vegetação preservada que não aparece nas manchetes. É claro que temos problemas, mas não é justo reduzir a Amazônia a um símbolo único de devastação. A realidade é muito mais complexa.

Acompanhando o campo de perto, vejo diariamente práticas sustentáveis que poderiam estar nas capas dos jornais. A integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), por exemplo, já ocupa cerca de 17 a 18 milhões de hectares, recuperando áreas degradadas, aumentando a produtividade e ainda sequestrando carbono. O potencial é ainda maior, mais de 150 milhões de hectares de pastagens podem ser convertidos sem necessidade de abrir novas áreas. Outro exemplo é o Plano ABC+, referência mundial em agricultura de baixo carbono, que prevê até 2030 mais de 72 milhões de hectares com práticas sustentáveis apoiadas por crédito e assistência técnica. O primeiro ciclo do plano já havia superado as metas de mitigação de gases de efeito estufa.

Também temos o Código Florestal Brasileiro, que obriga a manutenção de 20% a 80% da área preservada, dependendo do bioma, chegando a 80% na Amazônia. Poucos países produtores de alimentos no mundo têm uma lei tão rigorosa. E a matriz energética brasileira é amplamente renovável: mais de 80% da eletricidade vem de fontes limpas, como hidrelétricas, biomassa, eólica e solar. Isso significa que nossa produção agrícola já nasce com uma pegada de carbono menor do que a de muitos concorrentes internacionais.

Esses são fatos que mostram que o Brasil é referência mundial em práticas sustentáveis. O problema é que quase ninguém fora daqui conhece essa realidade. E, quando não comunicamos, deixamos que outros contem a nossa história. Foi exatamente o que aconteceu na COP28, em Dubai, quando países africanos levaram pequenos agricultores para contar suas histórias em painéis. Eles mostraram práticas simples, mas sustentáveis, e saíram aplaudidos como protagonistas. O Brasil, que tem milhares de agricultores familiares produzindo com respeito à natureza, não deu o mesmo espaço. Resultado: ficamos com a imagem de vilões, enquanto outros, com menos resultados concretos, brilharam pela narrativa.

E esse é o risco da COP30. Quem falar, aparece. Quem se calar, desaparece. Comunicação é disputa de narrativa. E, nessa disputa, quem não ocupa espaço, perde espaço.

Mas falar em responsabilidade também significa não fechar os olhos para os problemas. O desmatamento ilegal precisa ser combatido com rigor, porque mancha a imagem de quem trabalha corretamente e cumpre a lei. A infraestrutura precária aumenta tanto o custo ambiental quanto o econômico da produção. A burocracia e a insegurança jurídica desestimulam investimentos sustentáveis e deixam o produtor sem previsibilidade. E a comunicação frágil continua sendo nosso maior gargalo, mantendo o setor vulnerável a narrativas negativas. Reconhecer esses pontos não diminui o agro, pelo contrário, mostra maturidade, transparência e responsabilidade.

Na COP30, cada fala será mais do que discurso: será posicionamento. É o que sempre ensino na oratória, não é falar por falar, é falar com intenção. Um produtor que participa de um painel não pode se perder em dados técnicos. Precisa contar histórias reais que conectem, mostrar o rosto por trás do número e servir o outro com a sua mensagem. Imagine um pecuarista subindo ao palco para dizer que mantém 80% da propriedade preservada porque a lei exige, mas que os 20% restantes alimentam milhares de pessoas. Ou uma produtora de café mostrando que sua lavoura convive lado a lado com áreas de mata nativa, gerando renda sem destruir. Essas imagens são mais fortes do que qualquer gráfico. São elas que podem transformar a COP30 em um espaço de narrativas vivas, humanas e estratégicas.

A COP30 não será apenas uma conferência climática. Será um teste de imagem, reputação e coragem. O palco está armado. E o agro brasileiro tem conteúdo de sobra para se apresentar como protagonista global da agenda climática. A grande questão é: vamos ocupar esse espaço ou deixar que outros falem por nós?

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