O modelo de produção sustentável de cacau cabruca, realizado sob a sombra das árvores da Mata Atlântica, é um patrimônio histórico e cultural do Brasil. 

Nascida da adaptação do cacaueiro às condições da floresta, essa é uma forma de conciliar a produção de alimentos de excelente qualidade com a conservação da biodiversidade.

Mas, seu nome surgiu de uma pequena confusão linguística. De acordo com a história, tudo começou com um convite para abrir buracos na mata e plantar cacau no sul da Bahia. 

Os moradores diziam: “Venha cá brocar a mata.” “Cá brocar”. “Cabrucar”. Assim, o novo verbo e a forma de cultivo já tinham caído no gosto do agricultor.

Neste artigo, a Agrishow Digital convida você a conhecer detalhes deste modelo de produção, como seus principais benefícios e desafios. Acompanhe!

Cacau cabruca na Mata Atlântica: relação direta 

Além de ser o precursor de um chocolate muito gostoso, o cacau cabruca também é um mecanismo muito relevante para a proteção do bioma da Mata Atlântica.

O cacau encontrou nessa floresta um lar e um ambiente propício para o seu desenvolvimento, sem comprometer a área. 

O sistema cabruca, com sua sombra e diversidade de espécies, oferece ao cacaueiro as condições ideais para o seu crescimento, proporcionando um microclima adequado, proteção contra pragas e doenças e um solo rico em nutrientes.

O modelo produtivo se espalhou rapidamente pela região, impulsionando a economia cacaueira e moldando a identidade cultural da região.

Essa relação simbiótica entre o cacau e a Mata Atlântica gera uma série de benefícios para ambos. A cabruca, por sua vez, contribui para a conservação da floresta, preservando a sua biodiversidade e seus serviços ecossistêmicos.

Entretanto, o cultivo do cacau nesses sistemas exige a remoção do sub-bosque (vegetação de baixa estatura), além da retirada de alguns galhos. 

São medidas simples, mas que permitem a entrada de luz na mata, em um processo conhecido como raleamento.

Logo, as propriedades precisam ser acompanhadas de perto, com seus processos sendo feitos com cuidado. Isso evita os impactos negativos desnecessários para as espécies nativas, sobretudo as do sub-bosque.

Serviços ecossistêmicos proporcionados pelas cabrucas

As cabrucas, quando acompanhadas continuamente, prestam diversos serviços ecossistêmicos à região, como a regulação do clima, a proteção do solo e a manutenção dos recursos hídricos. Veja:

Regulação do clima 

A sombra das árvores maiores auxilia na manutenção da temperatura e da umidade do ar, amenizando o calor e proporcionando um microclima agradável para o cacaueiro e para outras espécies.

Além disso, a estratégia defende o cacau no Sul da Bahia das mudanças climáticas. Vale lembrar que essa é uma planta muito sensível às variações climáticas. 

A boa notícia é que, conforme um estudo da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), cultivar cacau cabruca diminui os efeitos negativos das mudanças climáticas.

O estudo prevê que as perdas são maiores em plantações a pleno sol. Isso comprova que a sombra das árvores da cabruca estabiliza o clima da plantação, permitindo continuar cultivando cacau à longo prazo.

Proteção do solo 

As raízes das árvores protegem o solo contra a erosão, evitando o seu assoreamento e a perda de nutrientes.

Além disso, o sistema não precisa de fogo no manejo. Ou seja, o solo da floresta é protegido, além de evitar acidentes com os trabalhadores.

Manutenção dos recursos hídricos 

As cabrucas ajudam a regular o ciclo hídrico, contribuindo para a infiltração da água no solo e para a manutenção dos nascentes e cursos d’água.

Ou seja, neste sistema agroflorestal, a copa das árvores nativas intercepta parte da água da chuva, permitindo:

  • Redução do impacto no solo;
  • Liberação gradual da água no solo;
  • Recarga dos aquíferos; 
  • Manutenção do fluxo de água nos rios.

Benefícios econômicos e sociais da cabruca

Esse sistema agroflorestal gera renda para os produtores, contribuindo para a economia local e para a valorização da cultura e das tradições locais. 

De forma geral, cerca de 50% dos produtores baianos que adotam o sistema não usam agrotóxicos nem fertilizantes. 

Com isso, o cacau produzido possui alta qualidade e valor de mercado, garantindo um produto diferenciado e sustentável.

Assim, graças ao esforço de produtores e ambientalistas, o cacau cabruca baiano começa a ser reconhecido pelo mercado como uma iguaria de alto valor.

Um artigo do Parque das Aves deixa isso bem claro. Ele destaca que, enquanto uma tonelada de cacau comum é vendida por US$ 3 mil na bolsa de New York, produtores de cacau fino conseguem até US$ 5.500 por tonelada!

Ou seja, mesmo que a produção gourmet seja pequena (só 1% do mercado brasileiro), este é um negócio que compensa financeiramente.

Desafios e ameaças ao Cacau cabruca

Mesmo diante dos muitos benefícios, a cabruca ainda enfrenta desafios importantes que merecem atenção, como:

  1. Pressão pela expansão de monoculturas; 
  2. Fragmentação da Mata Atlântica; 
  3. Impactos das mudanças climáticas. 

Pragas e doenças também podem afetar a produção de cacau em sistemas cabruca, caso da Vassoura-de-bruxa, exigindo estratégias de controle eficientes e sustentáveis.

Por essa razão, o manejo do cacau cabruca requer conhecimento específico, principalmente quanto às características do sistema, as espécies de árvores nativas, o controle de pragas e doenças e a adubação adequada. 

Além disso, a falta de assistência técnica e de capacitação pode dificultar o manejo adequado.

A Cabruca no Século XXI: olhando para o futuro

Ao longo do século XXI, a tendência é que a cabruca se modernize. Haverá o uso de novas tecnologias capazes de melhorar a produtividade e a sustentabilidade do sistema. 

A certificação e a busca por mercados especializados para o cacau de origem cabruca são importantes para valorizar o produto e garantir a sua competitividade.

Aqueles produtores certificados provam que essas medidas são valiosas e permitem produzir muitos alimentos de forma sustentável dentro da própria floresta. 

Essa visão permite que humanos e animais coexistem nas mesmas áreas, que já abrigam centenas de espécies selvagens. 

Ou seja, o futuro do cacau cabruca é promissor, desde que sejam implementadas políticas públicas que incentivem a sua produção e valorizem os seus benefícios ambientais e sociais. 

É fundamental que a sociedade reconheça a importância da cabruca para a conservação da Mata Atlântica e para o desenvolvimento sustentável da região cacaueira. Com isso, estamos contribuindo para um futuro mais verde e justo para o Brasil.

Você trabalha com cultivo de cacau? Então acompanhe nosso artigo exclusivo e veja detalhes sobre a colheita e comercialização do cacau.